Antes de falar a respeito do bem de família são necessárias algumas explicações sobre a evolução do conceito de família para o direito. É que somente assim é possível entender o que é o tema tratado no artigo.
A Constituição Federal, em seu artigo 1º, diz que o Brasil tem como fundamento a dignidade da pessoa humana. Além disso, no artigo 226, estabelece considerações sobre a família, salientando que é base da sociedade e recebe especial proteção do Estado.
E exatamente por estar na Constituição Federal que se pode dizer que a família possui ampla proteção. O fundamento da dignidade da pessoa humana possibilita a interpretação da Constituição no sentido de ampliar o conceito de família.
É fato notório na sociedade os inúmeros debates que ocorrem sobre o que é e o que não é família. Contudo, a interpretação que vem sendo dada pelos Tribunais brasileiros é exatamente a que visa conferir a máxima amplitude para a dignidade da pessoa humana prevista no texto da Constituição, ampliando o que é considerado família.
Portanto, embora inicialmente a família tenha sido percebida no conceito tradicional (homem, mulher e filhos), hoje existem muitos formatos familiares (por exemplo: união homoafetiva – homem e homem, bem como mulher e mulher; filiação socioafetiva – pai e mãe é aquele que cria; multiparentalidade – duas mães e/ou dois pais).
Assim, para o direito o conceito de família é definido de forma ampla.
Explicado o conceito de família de forma ampla, é possível avançar para os reflexos no direito imobiliário e no entendimento do que é bem de família.
A Lei nº 8.009 de 1990 trata sobre a impenhorabilidade do “bem de família”.
Em apertada síntese, a lei estabelece que o imóvel próprio e residencial do casal é impenhorável e, dessa forma, não responderá por qualquer tipo de dívida (seja civil, comercial, fiscal, previdenciária ou outra natureza), desde que contraída pelos pais ou filhos que sejam proprietários e lá residam. A grosso modo, portanto, é possível dizer que o único imóvel do casal não responderá pelas dívidas contraídas.
E isso significa que o Estado (juiz) não poderá determinar que seja vendido o imóvel do devedor a fim de quitar a dívida. Não haverá “penhora”. Dessa forma, o bem imóvel de família é impenhorável.
Agora fica claro o motivo pelo qual foi explicado que o conceito de família para o direito é analisado de forma ampla: a possibilidade de reconhecimento e aplicação do conceito de bem de família para benefício de todos os diversos formatos familiares, inclusive os formatos contemporâneos.
Por exemplo, o Superior Tribunal de Justiça, por meio da súmula nº 364, deixou sem qualquer dúvida de que a impenhorabilidade do bem de família abrange o imóvel que pertença a pessoas solteiras, separadas e viúvas.
Contudo, a própria Lei nº 8.009 de 1990, no artigo 3º, trata das exceções à regra. Assim, o bem de família poderá ser vendido para saldar algumas dívidas. Veja:
- Pagamento de crédito decorrente da aquisição de imóvel e/ou construção;
- Pensão alimentícia;
- Impostos, taxas e contribuições devidas em função do imóvel;
- Se adquirido com produto de crime ou para execução de ressarcimento, indenização e/ou perdimento de bens em razão de sentença penal condenatória;
- Fiança concedida em contrato de locação;
Por fim, cabe salientar que a possibilidade de aplicação do conceito de bem de família deve ser analisada individualmente, de forma a se aproximar ao máximo do quanto estabelecido na Constituição Federal.